sábado, 26 de junho de 2010

Carriego em português



No começo do século XX o arredor de Buenos Aires vivia uma explosão demográfica, coma chegada maciça de imigrantes, áreas do subúrbio cresciam rapidamente numa das primeiras concentrações urbana das Américas. Em um dos bairros ma
is pobres, Palermo, dizem historiadores, nasceu o tango na mesma época em que foi morada, de sua curta existência em vida, do poeta Evaristo Carriego, que se fixou na sociedade argentina como o primeiro a representar o que ficou conhecido como “arrabal” portenho.

Embora o poeta tenha seu nome cravado neste espaço, um dos mais densos e ricos da América, só comparável ao “velho oeste norte-americano” ou o “sertão brasileiro”, que é arrabal portenho; pouco se sabe dele fora da Argentina, quando não sua poesia é vinculada exclusivamente a obra de Jorge Luiz Borges.


Carriego deu em seu livro Misas Herejes, e depois, postumamente, na Canción del bairro, toda a dor do bairro pobre, contemplado e vivido por ele. Poemas que falam da vida cotidiana, do dia-a-dia, que constituem reunidos, quase que uma peça teatral, a visão afetiva e sentimental da vida. Uma perspectiva lírica dotada de um realismo sentimental.


Pela primeira vez, 11 poemas de Carriego estão sendo lançados
em português pela Editora da UFSC, sob o título de Poesia Herege, numa homenagem aos 100 anos de publicação do original em 1908. O livro, com tradução e organização de Cláudio Cruz e Liliana Reales, tenta desmistificar a ligação entre Borges e o poeta, surgida a partir da publicação, por Borges, do livro que leva o mesmo nome de Carriego, e que, até hoje, continua sendo a principal fonte de conhecimento desse fora da Argentina.

Carriego por Borges
Alguns falam que Borges, cujo pai era amigo do poeta e a mãe pouco simpatizava, inventou Carriego ao seu uso modo, dando-lhe um contexto mais político a sua visão. Como bem fica evidente no prólogo de Evaristo Carriego, de 1930, em que Borges pergunta “como se produziram os textos, como pode esse podre rapaz Carriego chegar a ser o que agora será pra sempre?”. Atribuindo visão ficcionalizada de “jovem, orgulhoso, tímido e pobre” na resposta a pergunta, como bem observou Liliana Reales em artigo que acompanha Poesia Herege.


Em sua singularidade de homem literário, é visível o culto de Borges ao drama social, em que representantes da baixa cultura do arrabalde, como o compadrito e o gaúcho da fronteira, ganham significado dentro da construção econômica e social da época em que Carriego se firmou como representante.

Esse culto se firma em momentos melodramáticos, principalmente do livro póstumo Canción del bairro, de 1912; em que o poeta se choca com o progresso que
empurra os casarios pobres de Palermo. Borges diz que no livro Carriego apela para solene para a piedade do leitor com certo gosto pelas desgraças cotidianas e da pobreza, mas também uma afinação de ternura.

Para Cláudio Cruz a idéia de que Borges construiu Carriego é “rídicula”, por confundir personagem com pessoa real. “Ele foi o criador literário desse símbolo tão forte que é o arrabal portenho, e não só aquele que ficou conhecido como o compadrito, único motivo da atenção de Borges em relação à poesia de Carriego. Neste sentido, sim, Borges inventou Carriego”.

História
Carriego viveu boa parte de sua vida na Rua Honduras em Palermo, pra onde se mudou em 1897. Em 1990 começa a colaborar com artigos no jornal La Protesta, com seu amigo Alberto Ghiraldo, com quem compartia ideais anarquistas. Colaborou também com a revista Caras e Caretas e Nosotros. Morreu em 1912, vítima de tuberculose aos 29 anos.


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